'Queria ver minha filha andando', diz pai de mulher que venceu ação contra fabricante do Monjauro por má-formação congênita
09/12/2025
(Foto: Reprodução) Giovani e filha, em 1994
Arquivo pessoal
A exposição a substâncias químicas tóxicas durante sete anos de trabalho na fábrica da Eli Lilly, fabricante do Monjauro, levou a filha de Giovani Donizete Gomes Ribeiro a nascer com malformações congênitas, em 1994.
O fato foi reconhecido pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), em 27 de novembro deste ano, que condenou a empresa a pagar R$ 200 mil por danos morais e R$ 100 mil por danos estéticos, além de pensão vitalícia, plano de saúde, cadeira de rodas e despesas médicas da filha.
“Além de ser inédito, é um alerta. Um alerta para todo mundo que trabalha em qualquer tipo de indústria química”, disse Giovani, que trabalhou na fábrica da Eli Lilly, em Cosmópolis (SP), de 1988 a 1994.
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A filha de Giovani, que não quis dar entrevista e pediu para não ser nomeada, nasceu com mielomeningocele (malformação no fechamento da coluna vertebral do feto) e hidrocefalia (acúmulo de líquido no cérebro). Ele informou que não tiveram qualquer apoio da empresa durante a gestação, enquanto ele ainda trabalhava no local.
“Foi um diagnóstico muito terrível para nós”, informou.
Desde 2003, a Eli Lilly não atua mais em Cosmópolis. A fábrica foi assumida pela Antibióticos do Brasil Ltda. (ABL). O g1 procurou a Eli Lilly, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
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Processo
Foi somente em 2013, quando a menina tinha 19 anos que um advogado apontou a possibilidade de ela ter sido afetada pela exposição tóxica do pai.
Giovani explicou que já tinha exames antigos: um dele próprio, feito em 2003, que mostrava contaminação dele.
Depois, ao considerar um processo em nome da filha, eles fizeram exames nela, que apontaram metais pesados e agentes considerados cancerígenos, mutagênicos e teratogênicos. Essas substâncias são capazes de causar alterações no desenvolvimento do embrião ou feto, como as malformações.
Uma perícia analisou o ambiente da fábrica, onde havia diversos agentes capazes de interferir no desenvolvimento embrionário, e considerou a predisposição genética. A perícia também observou a possibilidade de exposição indireta da mãe da criança, diagnosticada com câncer de mama aos 32 anos, já que ela lavava as roupas e calçados usados pelo pai da criança.
Eli Lilly em Cosmópolis
Reprodução EPTV/Arquivo
Trajetória
Ao nascer, a bebê passou por uma cirurgia para colocação de uma válvula na cabeça e outra para fechar a coluna. Quando a criança tinha pouco mais de seis anos, ela apresentou problema na medula, que estava causando entortamento das pernas. Além disso, fez uma cirurgia no maxilar, informou o pai.
No entanto, apesar das sequelas, Giovani informou que a filha se mantém ativa. Hoje, ela tem 31 anos, é graduada em relações públicas e, segundo o pai, teve apoio de um programa da universidade em que frequentava voltado para pessoas com deficiência. Ela pratica natação e o pai também contou que a filha chegou a trabalhar, mas teve de se afastar por conta da saúde.
“Ela é bem ativa e vive em uma cadeira de rodas, é duro para ela. Eu sinto tristeza, não queria estar nesse momento dando uma entrevista dessa para você [sobre a decisão do TST], entendeu? Eu não queria que ela ganhasse 100 milhões de dólares, eu queria ver a minha filha andando, tendo filhos”, disse Giovani.
Caso Shell/BASF
Giovani foi desligado da empresa em 1994, pouco tempo após o nascimento da filha.
“Saiu um boato de que a minha filha nasceu deficiente por conta da contaminação. Quinze dias depois eles me mandaram embora”, contou.
O ex-funcionário da Eli Lilly mudou-se para Paulínia (SP), em 1997. Por lá, mais tarde, conheceu o caso Shell/BASF, onde funcionários que trabalharam em uma fábrica de pesticidas foram afetados pela contaminação química. O solo e o lençol freático também foram contaminados. Foi ali ele que começou a pensar na possibilidade de ter sido exposto aos agentes químicos.
“Naquela época, não se falava de contaminação, era uma coisa muito difícil”, disse.
Giovani contou que, após os anos na Eli Lilly, desenvolveu problemas respiratórios, neurológicos, comportamentais e físicos como crises de pânico, ansiedade, perda de memória, dores no corpo, hipertensão e hepatite química.
Ex-trabalhadores da Shell e da Basf em manifestação em frente ao Tribunal Superior do Trabalho
Amanda Lima/G1
Gigante do setor
Em novembro, a Eli Lilly atingiu um valor de mercado de US$ 1 trilhão, tornando-se a primeira farmacêutica a entrar no clube exclusivo dominado por gigantes da tecnologia e reforçando sua ascensão como uma potência no setor de emagrecimento.
A valorização de mais de 35% das ações da empresa este ano foi impulsionada principalmente pelo crescimento explosivo do mercado de medicamentos para perda de peso, como o Mounjaro.
As vendas do tirzepatide da Lilly, comercializado como Mounjaro para diabetes tipo 2 e Zepbound para obesidade, também superaram as da Merck Keytruda como o medicamento mais vendido do mundo.
Fabricante do Mounjaro, Eli Lilly se torna a primeira farmacêutica trilionária
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