OUÇA: Áudios revelam que homens mortos após cobrar dívida no PR desconfiavam que devedores eram envolvidos com crime organizado: 'Mexe com trem errado'
10/12/2025
(Foto: Reprodução) Homens de SP que foram cobrar dívida no PR sabiam que suspeitos eram envolvidos
Áudios divulgados pela Polícia Civil (PC-PR) nesta quarta-feira (10) mostram que dois dos homens mortos ao cobrar uma dívida em Icaraíma, no noroeste do Paraná, desconfiavam que os devedores eram envolvidos com tráfico de drogas e contrabando de cigarros. Ouça acima.
A investigação sobre as mortes de Robishley Hirnani de Oliveira, Rafael Juliano Marascalchi, Diego Henrique Afonso e Alencar Gonçalves de Souza completou quatro meses no dia 5 dezembro. Relembre o caso abaixo.
Os principais suspeitos do crime são Antonio Buscariollo, de 66 anos, e o filho, Paulo Ricardo Costa Buscariollo, de 22. Os dois estão foragidos desde o dia 9 de agosto.
✅ Siga o canal do g1 Maringá no WhatsApp
Em um dos áudios enviados por Alencar a Diego no início da negociação da cobrança de dívida, ele diz que está com medo de uma possível retaliação por parte dos Buscariollo, pois acreditava que ele estava envolvido em crimes. O áudio foi enviado no dia 4 de agosto.
"É esse ponto aí que eu estava meio receoso de te falar, Henrique. Ele mexe com uns trem errado aqui. Tivemos a notícia dele depois que eu fui entrar em contato aqui, em mexer com a compra do sítio, aí que eu fui saber quem era o cara", disse Alencar para Diego.
No dia 5 de agosto, após o primeiro encontro entre os quatro homens e a família Buscariollo, Diego mandou um áudio para esposa dizendo que a situação estava complicada. Na conversa, ele menciona o envolvimento dos Buscariollo com o tráfico.
"Hoje tá um pega aqui do c******. Correria! O povo se escondeu. O bicho tá pegando aqui hoje, hein? Vai fazer esse trem dar certo aqui, mas nós estamos num pega meio brabo aqui. O cara trafica cigarro aqui, passa pro Paraguai, sem vergonha, malando. Nós estamos meio esperto por causa de tiro, assim, dessas coisas, né? Mas vai dar certo, sim. Se Deus quiser, alguma coisa vai dar certo, né?", disse Diego para a esposa.
De acordo com o delegado Gabriel Menezes, há indícios de que a família Buscariollo tenha ligação com o contrabando de cigarros e com o tráfico de drogas, e que esse esquema pode os envolver com o crime organizado. Esses indícios ainda estão sendo investigados.
Procurado, o advogado dos Buscariollo não comentou as afirmações sobre o envolvimento dos suspeitos com o crime organizado. Mas afirmou que a autoria dos homicídios ainda não foi elucidada e que os Buscariollo fugiram para que o crime pudesse ser solucionado. "Eu acredito fielmente que se eles tivessem sido capturados lá naquela época, nunca teriam sido resolvidos os homicídios que aconteceram, porque já ia ter um bode expiatório, alguém para ser condenado por esse caso. Então graças a esse desaparecimento, a essa omissão presencial no processo dos Buscariollo, é que a investigação tomou corpo", diz o advogado. Veja abaixo as alegações da defesa dos suspeitos.
Leia também:
Postou 'stories' no exterior: Juiz do Paraná é suspeito de morar fora do país enquanto deveria cumprir expediente presencial
Investigado por pedofilia: Morador do PR se torna suspeito de instalar câmera em banheiro
Resultado: UEL divulga lista de aprovados no Vestibular 2026
Passo a passo do assassinato
Delegado explica passo a passo da morte de homens que saíram de SP para cobrar dívida
Os quatro homens que saíram de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, para cobrar uma dívida em Icaraíma, no noroeste do Paraná. A investigação apurou que as vítimas foram mortas instantaneamente em uma emboscada, ainda dentro do carro.
Segundo a polícia, Alencar contratou o serviço de cobrança com Diego, pelo custo de 50% do valor da dívida.
Os cobradores chegaram a Icaraíma na tarde do dia 4 de agosto e foram com Alencar até o distrito de Vila Rica para fazer o primeiro contato com Antônio e Paulo. Nesta ocasião, a polícia apurou que os Buscariollo tentaram ceder uma casa na área urbana da cidade, mas não chegaram a um acordo.
No dia seguinte, por volta das 10h26, os quatro homens vão novamente até Vila Rica para cobrar a dívida, mas não encontram os Buscariollo e retornam à Icaraíma.
Por volta das 12h04 do dia 5 de agosto, os quatro homens voltam a Vila Rica, com uma Fiat Toro. A investigação da polícia apurou que as vítimas foram mortas assim que chegaram na propriedade rural que era objeto da dívida, por volta das 12h30.
"Possivelmente, foram alvos de uma emboscada, com o início dos disparos quando eles ainda estavam dentro do veículo Fiat Toro, chegando no local. Foram realizados disparos de, ao menos, cinco armas de fogo, de calibres diversos, deflagrados de três pontos distintos, atingindo o veículo na parte da frente, parte traseira e pelo lado esquerdo", afirma a polícia.
A investigação reuniu um conjunto de indícios que indicam que os quatro homens não foram sequestrados, nem mantidos em cativeiro ou torturados, pois as mortes foram instantâneas.
Após serem assassinados, de acordo com a polícia, os quatro homens foram levados, dentro do próprio carro, até a cova onde eles foram enterrados. Em seguida, o veículo foi levado até o bunker e enterrado.
Polícia descobriu que local onde crime aconteceu é próximo de onde carro e corpos foram enterrados.
Polícia Civil (PC-PR)
"Essa conclusão é possível porque os disparos foram realizados, possivelmente, quando as vítimas ainda estavam na Fiat Toro, atingindo regiões vitais (cabeça e tórax), o que torna remota a possibilidade de sobrevida para manutenção em cativeiro. [...] Ainda, a localização de pedaços do veículo Fiat Toro na cova onde as vítimas estavam aponta que os corpos foram retirados às pressas da Fiat Toro e colocados na cova, logo após a execução. Há imagens de câmeras de segurança que foram obtidas pela Polícia Civil que mostram o veículo Fiat Toro seguindo em direção ao local da cova logo após a execução, robustecendo a tese de que houve morte instantânea, seguida do enterro dos corpos e do veículo", diz a polícia.
As imagens de câmera de segurança não foram divulgadas pela polícia. Segundo o delegado Gabriel Menezes, as informações relacionadas a autoria do crime ainda seguem em investigação.
Os laudos de necropsia dos corpos dos quatro homens revelaram que eles foram encontrados em estado de saponificação -- que é uma reação química que interrompe a decomposição natural, preservando os corpos das vítimas. Segundo o relatório da polícia, isso foi possível em razão das características do solo em que eles foram enterrados. Veja detalhes dos laudos abaixo:
Robishley Hirnani de Oliveira: Foi morto com três tiros nas costas, um na cabeça, um no braço e dois no tórax. Um projétil ainda estava alojada na cabeça;
Diego Henrique Affonso: Morto com nove disparos, sendo um na cabeça, seis no tórax, dois nos braços. Dois projéteis eum fragmento foram encontrados no corpo dele;
Rafael Juliano Marascalchi: Morto com seis tiros, sendo três na cabeça, dois no tórax e um na perna;
Alencar Gonçalves de Souza Giron: Um tiro na cabeça.
Perto dos corpos também foram encontradas peças da Fiat Toro, o que segundo o delegado, indica que os suspeitos agiram com rapidez para enterrar as vitimas.
O laudo ainda concluiu os tiros foram disparados de pelo menos três pontos diferentes e foram usadas ao menos cinco armas, sendo uma delas um fuzil. Por isso, a polícia afirma que trabalha com a linha de investigação de que pelo menos cinco pessoas participaram do crime.
Josiane Monteiro, advogada que representa a família de Robishley, Diego e Rafael, disse que vai se manifestar após a análise dos laudos. O g1 também entrou em contato com o advogado da família de Alencar, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.
O advogado Renan Farah, que representa os suspeitos Antônio e Paulo, se manifestou sobre o caso. Veja a íntegra abaixo.
"Primeiramente, é muito importante destacar que quanto à autoria dos homicídios, isso ainda não foi elucidado. Veja que ainda estão sendo feitas diligências para apurar isso, que ainda não foram descritas porque elas estão em andamento. Então, isso é muito importante porque se toda a população, toda a mídia já tinha considerado que os Buscariolo eram os verdadeiros responsáveis pelos homicídios, a gente vê que, se nem a Polícia Civil conseguiu concluir com essa mesma certeza, isso demonstra que existem outras vertentes que estão sendo investigadas.
A gente fica realmente à mercê da polícia conseguir desvendar porque nós não sabemos, a gente somente sabe que não foram os Buscariollo. Além disso, eles até hoje não se entregaram. Eu acredito fielmente que se eles tivessem sido capturados lá naquela época, nunca teriam sido resolvidos os homicídios que aconteceram, porque já ia ter um bode expiatório, alguém para ser condenado por esse caso. Então graças a esse desaparecimento, a essa omissão presencial no processo dos Buscariollo, é que a investigação tomou corpo.
A Polícia Civil explicou que o sigilo absoluto do processo [...] era porque eles estavam apurando eles mesmos, porque nem a própria Polícia Civil tinha acesso a tudo que estava sendo feito. Que eles estavam investigando eles mesmos, que eles estavam com suspeitas de que houve eventual auxílio aos culpados em conseguir ocultar e atrapalhar as investigações. Pode até ser verdade, mas saiba que os Buscariollo estavam muito longe da cidade, logo não foram eles quem eventualmente tiveram algum auxílio de Polícia Civil. Então, ou eles realmente estão localizando as pessoas responsáveis, ou talvez a Polícia Civil, esses aí investigados, tenham um pouco mais de responsabilidade daquilo que foi admitido agora pela delegacia.
Há divergência quanto aos valores. O Alencar diz que a dívida era de R$129 mil. Os Buscariollo fizeram as notas promissórias R$255 mil, que já explicamos anteriormente, eram para fins fiscais. Na verdade, quem devia era o Alencar, que tinha que devolver a propriedade porque ele vendeu e não pagou, e os cobradores disseram para os seus familiares que a dívida que iriam cobrar era de R$1 milhão.
De duas uma: ou eles estavam mentindo para a própria família, estavam completamente enganados sobre o valor, mas não é uma diferença mínima, né? Ou não eram só os Buscariollo que eles iriam cobrar. E aí encontraram o outro devedor do montante mais significativo e encontraram, não o pagamento, mas sim uma resposta totalmente violenta".
Políciais civis foram alvos de mandados de busca e apreensão
Na terça-feira (9), dois policiais civis de Icaraíma foram alvos de mandados de busca e apreensão, por serem suspeitos de passar informações que facilitaram a fuga dos investigados. O caso foi informado à Corregedoria da Polícia Civil, que apura a situação.
"O que se busca apurar é, se após o crime, os investigados tiveram algum benefício com informações que possam ter facilitado a fuga ou destruição de vestígios para prejudicar as investigações", informou a polícia.
Segundo o delegado, os agentes podem responder pelo crime de favorecimento pessoal e corrupção. Também serão investigados na esfera administrativa e, se confirmada a ação, poderão ser demitidos.
Até a última atualização desta reportagem, a polícia informou que eles foram realocados de delegacia, mas não informou em qual unidade estão.
Relembre o caso, ponto a ponto:
Registro do desaparecimento
Quem são as vítimas e as fichas criminais
Motivação do crime: dívida e emboscada
Identificação de suspeitos e mandados de prisão
Localização do carro em bunker
Corpos são encontrados
Registro do desaparecimento
Robishley, Rafael e Diego viajaram de São José do Rio Preto, em São Paulo, para Icaraíma, no noroeste do Paraná, e se encontraram com Alencar Gonçalves de Souza no dia 4 de agosto.
No mesmo dia, eles foram até o distrito de Vila Rica do Ivaí para encontrar o devedor e combinaram retornar no dia seguinte.
A câmera de segurança de uma panificadora fez o último registro dos quatro, na manhã do dia 5 de agosto. Veja abaixo:
Vitimas foram vistas pela última vez em uma padaria em Icaraíma.
Polícia Civil (PC-PR)
Segundo a polícia, por volta das 12h do mesmo dia, as vítimas conversaram com as famílias pela última vez.
No dia 6 de agosto, a esposa de Robishley procurou a polícia do estado de São Paulo para registrar o sumiço do marido e dos amigos dele. Nesta período, o caso ainda era investigado como desaparecimento.
Quem são as vítimas
Diego Henrique Da esqueda para a direita, Afonso, Robishley, Rafael e Alencar.
Reprodução
Em novembro, polícia divulgou as fichas criminais dos quatro homens e afirmou que existe uma investigação para apurar se eles possuíam envolvimento com o crime organizado. O resultado dessa investigação não foi divulgado.
Além disso, durante as buscas, familiares e amigos falaram sobre os quatro homens e deram mais detalhes sobre a vida deles.
Diego Henrique Affonso
Morador de Olímpia (SP), acompanhava Rafael e Robishley na viagem para Icaraíma com a missão de cobrar a dívida. Ficha criminal:
2024: ameaça contra esposa, no âmbito da violência doméstica (Lei Maria da Penha), estelionato;
2023: estelionato, ameaça, redução a condição análoga à de escravo;
2022: ameaça, estelionato;
2021: estelionato, difamação, ameaça, injúria;
2019: apropriação indébita;
2018: ameaça.
Segundo a Polícia Civil, Diego não chegou a ser preso.
Rafael Juliano Marascalchi
Morava em São José do Rio Preto (SP), era casado, pai e avô. Vivia da renda de seus imóveis e, segundo a família, ocasionalmente fazia serviços de cobrança para conhecidos. Ficha criminal:
2025: ameaça;
2023: exercício arbitrário das próprias razões - fazer justiça com as próprias mãos;
2022: exercício arbitrário das próprias razões - fazer justiça com as próprias mãos;
2018: ameaça;
2017: ameaça contra a esposa, no âmbito da violência doméstica e familiar.
2014: ameaça;
2008: tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas;
2007: tráfico de drogas;
2005: tentativa de homicídio.
Segundo a Polícia Civil, ele foi preso em 2005, 2007, 2008 e 2010.
Robishley Hirnani de Oliveira
Tinha dois filhos, uma menina de sete anos e um bebê de oito meses. Era amigo de Rafael e o convidou para a viagem, tendo já trabalhado com ele em outras ocasiões. Ficha criminal:
2018: dano, estelionato, ameaça;
2017: estelionato;
2016: ameaça, exercício arbitrário das próprias razões, ameaça contra esposa no âmbito da violência doméstica, lesão culposa no trânsito e fuga do local do acidente, estelionato;
2015: estelionato;
2014: embriaguez ao volante, estelionato, ameaça;
2013: ameaça contra esposa no âmbito da violência doméstica; crime ambiental contra flora;
2003: furto qualificado;
Segundo a Polícia Civil, ele foi preso em 2022.
Alencar Gonçalves de Souza
Morador de Icaraíma, foi quem contratou os serviços do trio de São Paulo. Era próximo da família de uma das vítimas e aquela foi a primeira vez que desapareceu. Ele não possuía antecedentes criminais.
Motivação do crime: dívida e emboscada
Segundo a polícia, a motivação era a cobrança de uma dívida de R$ 255 mil, relacionada à venda de uma propriedade rural por Alencar à família Buscariollo.
O pagamento foi dividido em dez notas promissórias de R$ 25 mil cada, mas nenhuma parcela foi paga.
Em setembro, o delegado Gabriel Menezes disse que, apesar dessa falta de pagamento, a propriedade foi transferida para um dos filhos de Antonio e foi registrada em cartório no dia 5 de agosto de 2024.
A suspeita é de que Antonio e Paulo Buscariollo tenham participado de uma emboscada no momento em que os quatro homens foram cobrar esse valor.
Identificação de suspeitos e mandados de prisão
Pai e filho são considerados foragidos pelo desaparecimento de quatro homens
PCPR
No dia 6 de agosto, Antonio Paulo Buscariollo receberam os policiais na propriedade deles, no distrito de Vila Rica do Ivaí. Os dois aceitaram ir à delegacia, onde confirmaram que houve um negócio de compra e venda de uma propriedade rural entre Alencar e dois parentes, mas negaram relação direta com a dívida.
Após serem liberados, eles desapareceram, assim como todos os familiares deles que moravam no mesmo local.
No dia 9 de agosto, a Justiça expediu mandados de prisão temporária contra os dois. Eles permanecem foragidos desde então.
Antonio possui antecedente criminal por posse ilegal de arma de fogo, mas Paulo não tem passagens pela polícia.
Os nomes dos familiares deles que também sumiram não foram divulgados. Porém, a polícia disse que todos são investigados.
Localização do carro em bunker
Carro foi retirado do bunker na madrugada de sábado (13).
PM-PR Ambiental/Reprodução
O carro que as vítimas usaram na viagem a Icaraíma foi encontrado no dia 12 de setembro. O veículo foi localizado pela Polícia Militar Ambiental de Umuarama, enterrado em um bunker, em uma mata fechada na área rural de Icaraíma.
O veículo estava coberto por uma lona. Segundo o coronel Hudson Leôncio Teixeira, secretário de Segurança Pública do Paraná, a picape das vítimas foi encontrada após o pai de uma delas receber uma carta anônima com a localização do carro. Um informante também ajudou nas investigações.
O carro apresentava vestígios de sangue e marcas de disparos de arma de fogo, além de vidros quebrados e bancos danificados.
O bunker estava localizado a nove quilômetros de distância da propriedade da família Buscariollo.
Galerias Relacionadas
Corpos encontrados
Corpos de homens que saíram de SP para cobrar dívida no PR são encontrados
Os corpos dos quatro homens foram encontrados na noite do dia 18 de setembro. A confirmação foi feita na manhã do dia 19, pelos delegados Gabriel Menezes e Tiago Andrade Inácio. Eles estavam com marcas de tiros.
As vítimas estavam enterradas em uma vala, que estava coberta por plantas, a uma distância de 650 metros do ponto onde a picape das vítimas havia sido desenterrada.
A identificação inicial das vítimas foi auxiliada pelas roupas que vestiam. Eles também foram identificados pela Polícia Científica por meio de exames de papiloscopia, e foram produzidos laudos necroscópicos.
VÍDEOS: Mais assistidos do g1 Paraná
Leia mais notícias em g1 Norte e Noroeste.